A paralisação dos camionistas ficou ontem manchada com a morte do proprietário de uma transportadora, em Zibreira, Torres Novas. José Ventura, 53 anos, tentava travar um camião que furara o bloqueio e foi atropelado mortalmente. O condutor do pesado está detido e será ouvido hoje em tribunal.
Correio da manha
Condutor que atropelou José Ventura prestou declarações à GNR e saiu em liberdade
"Foi um assassínio". Luís Esteves, 29 anos de idade, filho do motorista que ontem, pelas 130, morreu, ao ser atropelado por um camião, junto ao parque industrial de Zibreira, concelho de Alcanena, não admite que se tenha tratado de um "acidente". O pai - não duvida - "foi atropelado de propósito".
José Ventura, o motorista falecido, 53 anos, proprietário de uma pequena empresa de transportes do concelho de Torres Novas, "pendurou-se na janela da cabine do camião", para tentar convencer o motorista a não abandonar aquela área (nó da A1 com a A23), onde se mantinha, ao final do dia de ontem, um dos piquetes para promover a paralisação dos transportes de mercadorias. Depois de "abrandar a marcha", o condutor do camião "acelerou e no cruzamento, apesar do sinal Stop, virou para a esquerda sem parar, recorda, ao DN, Manuel Agostinho, outro dos elementos do piquete, que, na altura almoçava com alguns colegas. José Ventura caiu, acabando por ser apanhado pelo rodado do veículo, conta, ao DN, um motorista, sem subscrever totalmente esta versão. "Ele não fez aquilo para matar o colega". José Ventura "não deve ter conseguido segurar-se e caiu", acrescenta o mesmo condutor, escusando identificar-se.
Seja como for, "esta luta já tem uma morte sem qualquer necessidade", sublinha Rui Santos, vizinho e amigo da vítima. Estava em casa, em Sobral, na freguesia de São Vicente do Paul (localidade de onde era natural e residia a vítima) "quando soube do caso e vim logo para cá", diz ainda, ao DN, Rui Santos, que quando ali chegou já o corpo tinha sido retirado dali e transportado para o Gabinete Medicina Legal em Tomar.
O cadáver só foi removido pelas 15.00, duas horas depois do atropelamento. "O corpo ficou aqui esse tempo todo para mostrar ao país que foi um assassínio", explica Luís Ventura, que optou por se manter no local, em vez de ir para casa, para junto da mãe e da irmã, dos filhos e dos sobrinhos, que "estão a sofrer muito". Mas "tenho de continuar aqui, tenho de assumir a posição do meu pai, que era a cabeça deste piquete". E que "morreu a lutar pelos colegas", acrescenta Luísa Bento, também proprietária de uma pequena transportadora ("tenho três carros") e que conhecia bem o Ventura "as dificuldades com que lutava para manter de pé a empresa", com quatro camiões e onde, além dele o do filho, trabalhavam dois motoristas.
O condutor do veículo que atropelou José Ventura foi levado pela GNR até um posto na região desta força para prestar declarações e, apurou o DN, saiu em liberdade, pois a GNR terá considerado que se tratou de um homicídio involuntário, embora os guardas, entretanto, para ali destacados, se tenham escusado a fornecer quaisquer informações
Ministro avisa
O ministro da Administração Interna lamentou, em Brasília, a morte de José Ventura. "O Ministério da Administração e as forças de segurança irão desenvolver todas as medidas para que a Constituição valha, para que os direitos sejam respeitados e para que as pessoas possam circular e trabalhar livremente", disse Rui Pereira citado pela Lusa. O governante deixou ainda um aviso: "Portugal é um Estado de direito democrático, onde prevalece a lei e a Constituição e, por isso, espero que todos os cidadãos tenham sentido de responsabilidade cívica".