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Um Monstro na Cidade

 Maria Prazeres Quintas - Coimbra

 

         Há anos que um Monstro vive e se alimenta no sítio onde era antes uma das portas da cidade. Ele é uma ameaça. Sempre foi e incomoda. Incomoda, mais directamente, quem vive mesmo perto do Monstro, porque sentem, cheiram e apalpam os seus dejectos!...

Afecta também todas as pessoas da cidade, pois que o sítio do Monstro dela já faz parte.

         A Cidade é das mais antigas do seu País. Nela teve, por algum tempo, sua corte, o primeiro rei, o qual escolheu ficar ali para sempre. É lá que esse rei tem o seu túmulo. Também nessa Cidade viveu e repousa eternamente, a rainha que foi santa. Uma sábia e bondosa rainha que os povos do País, e do País vizinho, veneraram e que ainda veneram. Nela se viveu, também, uma das mais belas e trágicas histórias de amor do romance dum principe, que mais tarde foi rei, e uma nobre dama morta por ceder a esse mesmo amor. Sentimento proibido por interesses políticos e de Estado. Foi uma história cantada por poetas e “trovadores”. O maior poeta desse País também a cantou em verso… Um poeta grande, o maior de todos, conhecido e reconhecido em todo o Mundo. Ele também viveu nessa cidade e ali teve tempos conturbados de juventude, de rebeldia e de paixões.

         Mas há mais, para que essa cidade seja das mais importantes da História do País. Nela foi fundada a Universidade mais antiga que o País teve. Durante séculos foi a única Universidade existente e a ela acorreram os jovens estudantes vindos de todas as partes. A cidade está repleta de tradições, relatos, lugares, enredos…relacionados com essa vivência estudantil que se nota por todo o lado. Homens do Saber e das Artes registaram-nos em seus trabalhos. Nela viveram, para além do grande Poeta, outros poetas também grandes, escritores, homens da ciência, «do engenho e da arte» e Doutores Catedráticos que formaram durante séculos o saber e a cultura do País inteiro. É uma cidade que muitos povos procuraram e habitaram fazendo dela entrepostos, marcantes em cada época. Ruínas e testemunhos arqueológicos desses tempos fazem também parte do espólio histórico nacional quiçá, também, universal…

         Mas, no presente, a cidade parece não merecer tanta História, ainda que a sua Universidade velhinha, já não a única do País, mantenha grande prestígio e continue depositária de tradições que vai preservando. Também, no presente, a cidade fornece ao País o que há de melhor na arte de tratar doenças…Só que hoje a cidade está ameaçada!

         Durante anos, o tal Monstro gerou dinheiro e produziu produtos também necessários ao País e, por isso, foi sendo suportado… Mas agora, querem dar de alimento ao Monstro materiais perigosos. Muito perigosos e que vão activar ainda mais esses malévolos gases expelidos. Quer-se assim tratar o Monstro, por outros interesses menos claros, por outros negócios!… e a cidade, que tem o peso de tanta tradição, de tanta história, poderá, um dia, sucumbir a qualquer má digestão do Monstro,  alimentado, em parte ,pelos  tais resíduos perigosos e tóxicos.

A cidade poderá sucumbir miserável e cobardemente! Nela habitam pessoas e se o Monstro, num dia azarado, tiver uma indisposição, os seus vómitos tóxicos e venenosos, para além de invadirem todo o espaço urbano, chegarão rápido e em linha recta aos principais hospitais, incluindo o pediátrico. Eles distam, numa linha recta, a um quilómetro do tal sítio do Monstro. Se ele, na fúria das suas cólicas, explodir de raiva, levantando voo... como poderão as pessoas ser socorridas? Aonde se dirigirão aqueles que sobreviverem a tal catástrofe? E, entretanto, a cidade deixará de ser a “cidade” do primeiro rei, ou do grande poeta, do eterno romance de Amor, a cidade da Rainha Santa, e da Universidade Medieval das mais “velhinhas do Mundo”, para ser a cidade do Monstro.

Essa cidade dos estudantes, dos doutores, do saber… da saúde, a cidade que muitos povos antigos habitaram e dela fizeram centros importantes para essas épocas, passará a ser a cidade do Monstro perigoso.

         Passará, assim, Coimbra a ser a cidade da co-inceneração. E o seu povo não merecerá tanta História, porque não a soube defender. Ao assassínio de tão grande legado de História e Tradição, ficará associado o nome dos governos e das pessoas que o decretaram. E, talvez também, se tenha que culpar a própria Europa, essa Europa a que Portugal pertence!...

 Maria Prazeres Quintas - Coimbra

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